sábado, 2 de março de 2013

Opinião - Kafka à Beira-Mar de Haruki Murakami

Antes de ler Kafka à Beira-Mar estava de acordo com a opinião de vários leitores que consideravam 19Q4 o livro mais ambicioso de Haruki Murakami (a trilogia). Contudo, após terminar de ler este livro, a minha opinião mudou. Kafka à Beira-Mar é na minha opinião o livro mais complexo e mais ambicioso do escritor japonês. 

Neste livro acompanhamos duas personagens principais recheadas de singularidades muito interessantes. De um lado, o jovem de 15 anos Kafka Tamura. Kafka Tamura foge de casa do pai impulsionado pela má relação que nutre com ele e pelo angústia que sente relativamente à vida que tem. Tamura foge de tudo não fugindo de nada. Assombrado por vários traumas de infância, Tamura vive a vida calma e metodicamente perdendo por vezes o controlo de si próprio resultando em lapsos de memória. Do outro lado, temos Nakata. Um idoso que em jovem sofre um acidente do qual não se lembra causando-lhe analfabetismo e segundo o próprio Nakata, "falta de brilhantismo". No entanto, Nakata está longe de ser a imagem do analfabetismo que imaginamos habitualmente e torna-se uma personagem surpreendente à medida que o livro se vai desenvolvendo. Nakata é dono de algumas características muito particulares mas decidi destacar duas: Nakata tem a habilidade de falar com gatos com compreensão mútua e consegue permanecer a dormir durante mais de 30 horas consecutivas sem quaisquer movimentos. A par destas duas personagens principais, o livro conta com mais alguns elementos que poderão também ser considerados protagonistas e que acompanham os nossos protagonistas nesta trama. Ao lado de Kafka Tamura permanece Oshima, bibliotecário cujas características físicas e psicológicas peculiares o tornam uma figura essencial desde romance. Ao lado de Nakata está o simples e leal Hoshino que acompanha o velhote auxiliando-o em todas as tarefas necessárias.

Mais uma vez, e correndo o risco de me repetir, Murakami oferece-nos uma linguagem poética meticulosamente cuidada que oferece a cada página um sabor perfeito. As personagens e os acontecimentos encadeados entre si resultam numa harmonia que não sinto em muitos dos livros que leio habitualmente. A exploração dos sentimentos humanos e das relações interpessoais, carnais ou não, apesar de explícitas, são abordadas pelo autor com uma suavidade tão sensível que nunca nos sentimos constrangidos na leitura. Murakami é exímio na escolha das expressões sexuais e constrói os ambientes cuidadosamente para deixar o leitor confortável e enquadrado na própria cena. Como complemento, quando começo um novo livro de Murakami começo-o já com a certeza de que com ele virá uma extraordinária banda sonora escolhida pelo próprio autor influenciada pelos tempos em que o Japonês era dono de bar de Jazz. Este conjunto de elementos tão cuidadosamente bem planeados transportam qualquer leitor interessado para um Universo próprio do qual é difícil sair.

Mais um trabalho excelente do autor. É provavelmente, tendo lido a quase totalidade da sua obra, o seu melhor trabalho. Aconselho sem reservas.

Deixo-vos, como conclusão desta opinião, duas músicas que acompanham a leitura e que são ouvidas pelos diferentes protagonistas do livro.



2 comentários:

  1. Um livro fabuloso que constrói uma história épica e bizarra mas, no fundo é uma viagem em busca do "eu". Murakami é dos meus favoritos porque me faz pensar e a cada página lança interrogações que mexem comigo!

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    1. Não sei se podemos considerar esta história como épica no verdadeiro sentido do termo mas sem dúvida que está recheada de inúmeros elementos bizarros. Esta viagem de Kafka Tamura parece-me o tipo de viagem que todos sentimos pelo menos uma vez a necessidade de realizar mas que não temos a coragem suficiente para o fazer. Murakami é também dos meus favoritos :)

      Boas leituras!

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